O dia estava ensolarado, a boca do céu tragou todas as nuvens.
O céu límpido das manhãs de novembro, porém, na face daquele homem tinha gotas d’água.
O dia chovia para ele.
O amplo campo verde reluzia os raios solares, o vento deitava vagarosamente sobre o capim, a tranqüilidade e o repouso demonstravam nomes, datas escatológicas e mensagens de adeus.
O homem com a face gotejada olhava fixamente para a lápide da mulher que perdeu há dois anos num acidente de carro. A amada faleceu em seus braços quando tentava socorrê-la, a infelicidade maior é que estava grávida de 5 meses.
Duas dores colossais abriam abismos em seu coração.
Decidiu ir para uma cidade no interior iniciar uma nova vida, ou melhor, destruir a própria existência sem sentido que vivia. O vicio tornou-se uma rotina: bebida alcoólica, cigarro e má alimentação. Todas essas práticas tinham uma finalidade crucial, à morte. Desejava passivamente a morte, pois a falta de coragem para o suicídio o acovardava.
Na cidade havia um pequeno sebo de livros usados. O homem possuía uma pequena biblioteca em casa, reunia os exemplares prediletos da sua amada.
Vendeu cada fragmento que o aprisionava a esposa, cada livro uma memória literária do amor. Em especial o livro preferido que repetidas vezes a amada o mandava ler.
Desfez de cada livro, expurgando a saudade.
Os livros foram vendidos rapidamente no sebo, tratava-se de livros literários belíssimos. O livro que a mulher o mandá-la ler foi adquirido por uma jovem mulher. Chegando na residência a mulher folheou o livro encontrando uma velha carta escrita a mão por uma mulher ao seu marido.
A jovem retornou ao sebo e procurou informa-se sobre quem era o antigo proprietário do livro que acabava de adquirir. O vendedor sabia pouco sobre o homem que desfez do livro.
O tempo passou...
Na tarde de janeiro, o dia estava ensolarado, o céu expeliu uma cortina de nuvens alvas, o campo verde do parque refletia a grama esmeralda. O homem caminhava lentamente hermético nos seus pensamentos. Enquanto caminhava distraído esbarrou numa jovem mulher derrubando seus pertences. Ao ajudar a mulher a recolher seus objetos, notou que existia um livro familiar no meio.
Estando curioso, convidou timidamente a mulher para tomar um café, sentaram num banco do parque e conversaram sobre diversos assuntos. Entre tantos assuntos surgiu o prazer da literatura, amor pelos livros.
A jovem num gesto efusivo apresentou o livro mais encantador que leu. O homem ficou supresso, porque se tratava do exemplar predileto da falecida esposa.
Os olhos castanhos submergiram em lágrimas infindáveis.
Perplexa com a reação do homem, a mulher perguntou se o livro simbolizava algo em especial na sua vida. Entre as gotas d’água que pintava sua face, e a voz soluçada, o homem começou a contar a história sobre sua esposa e o livro.
A mulher atônica folheou descontrolado o livro parando na página 105, nesta página estava o bilhete escrito a mão.
Calmamente a mulher sorriu, colocou a carta na página novamente, entregou o livro ao homem dizendo que era um presente e mandou-o ler a carta que se encontrava no livro.
A jovem levantou evaporando-se ao caminhar em direção da saída do parque...
Naquele mesmo instante o homem leu a carta, que dizia:
Querido Fernando,
Ao ler esse livro entenderá o quanto você é significante para mim, e caso algum dia eu não esteja presente em sua vida, saberá que estou com você nas entrelinhas de cada fragmento grifado por mim neste livro.
Amo-te!
A chuva voltou a cair na face do homem, que dobrou o bilhete colocando no bolso da camisa, cruzou as pernas e começou vagarosamente a ler o primeiro capitulo do livro...
(Alan Félix)
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